TIRANIAS DE ALGIBEIRA
Opressor, déspota, aquele
que abusa da autoridade para vexar os que dele dependem, é o que encontramos
por aí, e também no dicionário, e cada vez mais aqui e ali, como se de um
elemento natural se tratasse, como as heras que ofuscam a beleza da natureza
que cobrem, também aquele espécime tolda a força da democracia. Pequenas
incubadoras onde, num nicho de medo e opressão, fermentam pequenos tiranos de
algibeira, daqueles que nem numa carteira da feira da ladra teriam lugar mas
que se fazem enraizar nas profundezas da fragilidade humana, nas vazias
cavernas da Lei.
São uma espécie indiferenciada, de estatura média,
habitualmente afáveis e prestáveis, capazes de numa prometida bondade adiada
oferecer responsabilidade, compromisso, perspetiva de futuro àqueles mais
incautos que hipotecam num cheque em branco a miragem de um amanhã a troco do
presente agrilhoado em plumas.
O Estado de direito tem-se delegado enquanto
subescritor tácito dos direitos e ativo legislador dos deveres, carrasco das
obrigações, profeta das liberdades. A democracia é um bem maior que desmotiva
as aspirações dos espíritos térreos olvidados da necessária elevação moral a
que se devem obrigar, pobres almas que preferem curvar-se aos subterfúgios do
poder a nivelar-se numa fraterna igualdade.
O caminho é árduo, admitamos, e os tiranos de
algibeira aguardam na sombra pelos peregrinos dos atalhos, os que duvidam da
universalidade da justiça, unificadora, agregadora de opiniões, tantas vezes
tolerante dos caprichos, onde todos têm lugar, acusando-a de incapaz, de ser
desigual e rapidamente vergando-a ao interesse umbilical da justiça particular,
aquela que para se exercer basta preencher um critério, servir-se de muitos e
servi alguns.
Os guardiões dos direitos, da justiça e da democracia
permanecem em seus hábitos monásticos, confortáveis numa providência divina
eremita no conformismo da multidão. Aguardam um novo dia, esquecendo-se de que
são eles a alvorada do amanhã, a luz que deve aquecer a bondade dos corações dos
que no seu dia a dia, a troco de uma moralidade míope, apenas se vêem no
direito de obedecer e no dever de silêncio perante os que vêem o direito de
ordenar e o dever de subjugar.
Germinam pelos becos do oportunismo laivos de
prepotência que ecoam nas vísceras dos diferentes organismos que animam a
sociedade, metastizam-se, alastrando-se nas bases sensíveis da multitude,
alimentando-se no terreno fértil entre o Estado de direito e o direito das
gentes ao Estado. Os deveres têm revogado os direitos não à velocidade da Lei,
antes sim na subtil emergente urgência da manha desses tiranos de algibeira que
na troca de turno dos zeladores rapidamente alienam a autodeterminação, a livre
consciência, assediando para as masmorras da dúvida e da insegurança subalternos
à força.
Agir é
o imperativo moral, o dever cívico de cada um e de todos nós, agir rapidamente,
eliminando cada semente de tirania, impedindo-as de brotar as suas raízes e
alastrar as suas trevas, defendendo impreterivelmente a pureza da essência que
habita os espíritos livres somente ela capaz de emancipar a natureza da
condição humana.
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