Sim ao Brexit… E agora?



                O Reino Unido referendou e o seu povo votou. Disse SIM. Um sim à saída da União Europeia, um não à Europa. E agora?
                Tem crescido o alarido em torno desta que é uma das principais novidades, no início deste milénio, a nível europeu. Um estado-membro que tenta disfarçar a orelha que ferve e o nervoso miudinho da sua precipitação naquela que é uma decisão de peso com direito a inscrição histórica, e uma UE incapaz de esconder o ressabiamento de quem com ameaças não tem como as fazer cumprir, o mesmo papão que papa tudo e que afinal tem uma congestão!
                O árbitro deu vermelho e como se fosse tabu a irreversibilidade da decisão, os jogadores ainda discutem a opção tomada. Um não recua por prestígio e aquele que era um ás de trunfo revela-se uma bisca seca, o outro não recua por incredulidade, por não conformismo com a reviravolta inesperada no jogo.
                As especulações são muitas, as indecisões ainda mais. Os “mercados”, ai os “mercados”, essa coisa que todos evocam para amedrontar os mais verdes, dominados pelos mais maduros, esquecem-se que esse espécime do mundo financeiro é nada mais nada menos que constituído por pessoas, sim, pessoas, pessoas de carne e osso que simplesmente fazem investimentos e que naturalmente se protegem contra riscos. Como a picada que dói mas que afinal nada faz, assim os investidores se retraem de algo que desconhecem, qualquer coisa que lhes parece fusca mas que claro, dias depois da esquizofrenia nada mais foi que não isso mesmo, uma esquizofrenia infundada. Afinal os britânicos continuam a respirar e de boa saúde, a União Europeia continua como união e a ilha permanece no mesmo local, nada mudou (pelo menos, nada mudará no curto-prazo) e como se Merlin emergisse da lenda com suas mágicas a normalidade principia em regressar.
                A democracia tem dessas coisas, é muito melindrosa, deixa-se amuar com facilidade quando as vontades não lhe são de feição. Dizia Martin Schulz que saber ouvir opiniões contrárias faz parte da democracia, que ironia.
                Vejamos objetivamente o que acontece, o Reino Unido foi o estado-membro com a entrada mais mediática e menos conformada com os princípios de uma união europeia que se verificou. O projeto europeu nunca lhes interessou, não o justificasse a constante postura um pé dentro, um pé fora. Naturalmente os afrontamentos políticos e militares da história tenham levado a que tal decisão tivesse um pretexto de prestígio e evitar uma eventual desvantagem para uma Alemanha que rapidamente se erguia tínhamos aqui o contrapeso da balança, uma adesão por interesse e não interessada. Decidiram a sua saída, uma clara rejeição ao crescente protagonismo alemão e um reconhecimento pragmático de uma união que não funciona como tal mas sim como uma soma de países. Deste modo no curto-prazo nada teremos além deste birrento alarido a não ser as mais diversas movimentações, demagogias e manipulações políticas. Os países pequenos ancorados ao Reino Unido, dificilmente irão abdicar do conforto da UE, evitando assim reforçar o seu estatuto de pequenez, países de peso irão reforçar a sua hegemonia, nomeadamente com a aprovação de medidas que poderão truncar qualquer insurreição futura. Por outro lado esse crescente protagonismo poderá apoquentar algumas referências europeias atualmente pouco convencidas com o projeto comunitário. Uma Europa de todos para alguns pode continuar a inflamar os crescentes tumultos e inversões políticas (que se verificam) nos mais diversos países europeus contribuindo assim para o enfraquecimento de um modelo convencido mas que pouco convence. Economicamente, impera a racionalidade (felizmente) e muitas das grandes empresas foram precavendo-se para o pior dos cenários, o Reino Unido tem mais quem dele dependa do que de quem depender e naturalmente as relações económicas manter-se-ão, existem protocolos, acordos, etc, etc… bem como uma moeda da qual nunca abdicaram e afinal de contas seria e é a sua âncora. A Europa revela a suas garras e numa União a 27 decide a 3 uma bofetada com luva ou sem luva branca, isto é, revela dureza e inflexibilidade (autoritária) para com um estado-membro que democraticamente se anuncia de saída ou se de forma flexível (democrática) acomoda o adeus e acompanha até à porta aquele que ainda é um estado-membro de peso político e sobretudo económico no seio da União Europeia, ou não fosse Londres a principal praça financeira. Dada a dimensão do Reino Unido, qualquer agravamento aduaneiro a produtos oriundos daqui é infundado, dada a possibilidade de ripostar o que contribuiria apenas para a formação de um clima antártico nas relações políticas e económicas europeias e um retrocesso secular!
                Da UE deverá ser esperada uma postura superior, de relativa tranquilidade, não deverá levantar barreiras e optar pela estabilidade e por um processo de introspeção que lhe permita identificar as causas, possíveis réplicas que se levantem e discutir verdadeiramente o futuro da União enquanto união ao invés de perpetuar um simpático enredo de relações político-económicas entre estados. O Reino Unido, depois de perder a hegemonia mundial da sua moeda no dealbar do século passado, arrisca-se também a ver a principal praça financeira europeia a migrar para outra posição geográfica, deixando cair a joia da coroa! Que pensará a rainha sobre isto?!

                Ao contrário do que muitos afirmam o curto-prazo será profícuo em parra e o longo-prazo em uva, verificar-se-á que o alarido do momento incomoda pelo ruído e que o silêncio do futuro perturba pela incerteza! Com todo a certeza, vivemos momentos históricos.

by Filipe Cortesão

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