Paradoxo do Recrutamento



Recém-licenciado com experiência; licenciado sem experiência, com espírito de equipa e foco no cliente; licenciado com experiência com excelentes condições de carreira, disponível para estágio… Escutam-se risos no final. Não é… Mas podia ser… Não é não, não é um programa de stand up comedy. São alguns apanhados, não daqueles da televisão mas daqueles que encontramos nos anúncios de emprego. Maioritariamente são de empresas de recrutamento, prometem às nossas jovens promessas, saídas da faculdade, uma rampa de lançamento para uma carreira de sucesso na sua área mas… É uma longa rampa, literalmente, daquelas que ao invés de projetarem essas almas esperançosas e inocentes, as atira para uma cansativa subida a fim de perderem toda a força cinética com que a encetam, e quando despertam (por vezes tarde de mais) já não veem o início, nem alcançam o fim.
Um augúrio que se vai vivendo por aí, pelos becos do recrutamento, designadamente em algumas empresas que recrutam jovens licenciados para clientes seus. Recém-licenciado, sem experiência profissional, encontra-se confuso sobre que caminho escolher, entrega o seu destino ao oráculo dos deuses dos anúncios de emprego, talvez devesse ser este o prospeto, o fatum desses nossos jovens.
São condicionados, pelas próprias condições que lhes são impostas, uma falácia ou até mesmo um paradoxo, paradoxo do recrutamento, sim, parece-me o conceito mais lógico para algo ilógico também de si um paradoxo!
Empresas de recrutamento que por aí existem, com despacho de delegação de competências dos seus clientes que para cumprir tais desígnios também elas se alimentam dessa seiva pura que bruta do ensino superior, e por vezes até mesmo no tenro secundário encontram pródigos espíritos, imbuídos da mais nobre causa nacional, têm neles recém-formados em escolaridade mínima obrigatória, ou recém-formados numas quantas áreas ligadas a recursos humanos, sem experiência, completamente comprometidos com a oportunidade das suas vidas, também ela conhecida por Estágio.
Começa a diversão, uma montanha russa de trapalhada de tentativa-erro, matando-se assim dois ou até três coelhos de uma cajadada. Então um pouco à semelhança do Paradoxo Asno de Buridan, bem mais refinado, novo nestas andanças, o já apresentado Paradoxo do Recrutamento, entra em ação e faz das suas. Encontramos pois um inocente figurante deste paradoxo, recém-formado, sem experiência a recrutar um outro figurante, recém-formado com experiência, ou até numa saga mais empolgante, formado com anos de experiência noutras áreas, enquanto os artistas principais neste desgostoso espetáculo, conscientemente, se enganam mutuamente e a si próprios.
Neste teatro de marionetas temos pois, alguém instruído para tal e senhor de si a recrutar outro alguém, bem experimentado e também senhor de si, onde o primeiro pouco domina a linguagem técnica a que se propõe proferir uns chavões sem retórica, ignorando no outro as mais-valias intangíveis que brotam da experiência e que não têm lugar quantitativo e tão pouco qualitativo nuns quaisquer formulários que tipificam as capacidades humanas, e as resumem à veemência com que neles se desenham cruzes.
São várias e conhecidas, todos nós temos uma ou umas, umas quantas dessas histórias, connosco, com amigos, com conhecidos, de ambos os lados da barricada, um sem número destes dramas que não são coincidências, antes sim incidências, incidências paradoxais.
Meus caros, talvez vos desiluda, certos de que jamais vos pretendo iludir, esta é a dura realidade, a de que cada vez que se jogam ao livre arbítrio dos anúncios de emprego, a vossa consciência deverá revestir-se da certeza de que as vossas capacidades são imensuráveis, nenhuma folha de critérios, nenhum recrutador, nenhuma empresa de recrutamento terá compasso ou esquadro que vos quantifique ou qualifique.
Algo está errado, algo concreto, não o pronome indefinido, algo bastante definido, o emprego e o recrutamento. Se o emprego tem melhorado, pelos indicadores que se conhecem, muito trabalho há a fazer na eficácia do recrutamento, tanto no gap como no match entre procura e oferta, um pequeno passo, singelo, no sentido da melhoria da produtividade e da eficiência empregadora.
Nalguns daqueles países desenvolvidos e sobre os quais gostamos de falar num tom esperançoso, de construção utópica, os serviços públicos de emprego asseguram exclusivamente toda a oferta e procura, excetuando aquelas dirigidas pelas empresas que procuram recrutar para si, sem dúvida, num sentido maior de proteção tanto do desempregado, como do empregador.
Evitava-se assim a presunção recrutadora, o desleixo nacional de se encontrarem mais anúncios de emprego num qualquer sítio da internet que nas páginas oficiais dos organismos públicos com tais competências, bem como o desprestígio moral e social de alguém que na idade da esperança se vê ser ajuizado por ingénuos escudeiros que desconhecem, desdenham e defendem os lemas da tipificação humana.

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